Espalhei sobre a cama um álbum aberto de fotografias sem vida. Fotografias que eu não recordo, que eu não lembro de ter vivido. A agonia que me cerca e me prende, aperta-me mais agora, como uma cobra estranguladora que me procura matar sem piedade.
Sinto o peso de respirar. O meu nariz reconhece o mofo de um passado rico em sonhos e esperanças, apagados e manchados pelo tempo que cruelmente prega partidas às mais ingénuas cabeças que sempre sonham alto e acabam caindo de grandes alturas.
Revivo por segundos os momentos que espelham o meu outro eu. O eu que sorria com vontade e que hoje já não pode; já não consegue, já não sabe. As coisas tomaram novos rumos e nada do que era hoje é. As coisas mudaram drasticamente, como se tantos anos quantos a mente conseguisse esquecer, estivessem passado em branco, desde aqueles dias de sol em que eu brincava, ria e corria livremente sem preocupações algumas, como um pássaro fora da gaiola por poucas horas.
Carrego bilhas de água partidas nos olhos, águas turvas que me lavam a pele e me escorrem pelo queixo. Confronto-me a mim mesmo. Questiono esse maldito veneno que me escorre dum olhar apagado, como um ácido que me desfigura o rosto e me corrói a mente.
Num impulso, pego nelas. Agora marcadas pelos meus dedos. Os vestígios que eu não procuro apagar.
Arrumo-as num monte e novamente o cinzento do cobertor se adivinha, entre as folhas caídas de um Outono que há muito foi varrido pelo vento.
Adorei o texto.
ResponderEliminarCostumo pensar: será que se esquecermos o passado e o deixarmos mesmo no passado sem o trazer para o presente, o cobertor se torna colorido e não cinzento? (;