1.10.2012

Music Box


Abre-se o pano; A música começa.
Perde-se me nos olhos entristecidos os reflexos perfeitos da harmonia asfixiante que me aperta o estômago contra os fracos ossos das costelas despidas, magras, cruas, doridas pelos empurrões do tempo e pelas quedas bruscas desamparadas ao longo da estrada.  
É no seu movimento que me fixo, na sua pele que me invejo. Triste inveja que me visita quando esta tão indesejada nostalgia se instala no meu interior amedrontado, aborrecido e cansado com todos os dias saturantes que por mim passam, roubando mais um pouco daquilo que sou à descarada. Se ao menos pudesse assim correr atrás dele... Mas as suas pernas fogem de mim assim como o diabo foge da cruz. 
Os holofotes a iluminam. Doce bailarina de corda; pálida, tímida, sem alma.
Compõe para mim os passos de uma dança sem movimentos, onde o sorriso se torna a lua que segura contra a velha cadeira de teatro, onde pedaços do tecido gasto e comido pelas traças, revela histórias afastadas onde mergulho apaixonado, encadeado por toda a beleza e tentação que me amaldiçoa e me afunda sem dar conta, como uma âncora solitária á deriva no oceano.
Não sei mais se âncora sou, ou se âncora serei, mas qualquer coisa seria melhor que esta estranha incógnita e ausência que me cobre num véu de duvidas, vazios e hesitações, onde parece não haver espaço para nada, excepto os tristes dias de chuva e o choro melancólico da caixinha de música que me abala e me consola nas horas mais tristes em que os gritos me rompem o rosto e as lágrimas me consomem.
Por isso, encontro-me e perco-me em pensamentos, hipnotizado pela frágil bailarina que se desfaz enquanto essa maldita mente não se decide em qual buraco escuro naufragar e acalmar, arrastando-me para as profundezas nessa sentença pouco justa à qual me devo conformar com o suficiente tempo que imagino me restar duma vida de conformidades e rotinas sadomasoquistas.
Só temo tê-la perdido, como a areia do deserto entre as mãos e o sopro do mar nas costas, sussurrando-me sonhos do passado fossilados contra as paredes da minha vida sem teto, onde não há lugar definido para os reflexos luminosos de cada um dos seus passos que também em tempos quis dar. 

5 comentários:

  1. Que texto mais bem escrito! Me impressionei com suas palavras, gostei muito daqui, sempre que puder, voltarei ><

    Beijos

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  2. mais uma vez com muito sentimento e é isso que mantêm as pessoas coladas ao computador, á espera de mais um novo texto teu

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